Eu fui em uma viagem, um passeio de trem de Curitiba até
Morretes com alguns amigos e um deles convidou uma moça, chamada Bárbara e foi
então que a conheci.
Ela se apresentou e estendeu a mão em minha direção e eu até fiz menção de
responder o seu cumprimento, mas não consegui. Apenas fiquei a olhando e
afastei minha mão da dela. Sei que foi uma grosseria, no entanto não sou capaz
de tocar em outras pessoas, principalmente as que não conheço. O toque delas me
causa angústia, repulsa. É uma sensação agonizante.
Portanto, pedi desculpas a ela e mesmo gaguejando disse:
- Foi um prazer conhecê-la!
Ela sorriu e foi se sentar em um banco, próximo a porta.
Eu me senti uma completa idiota, mas já estava acostumada com isso. No entanto,
naquele dia senti algo diferente, quando ela se aproximou de mim, senti meu
coração acelerar e quando olhei nos olhos de Bárbara minha respiração ficou
pesada e o mundo parecia ter parado. Foi tão inesperado e estranho, mas também
excitante. Nunca havia sentido algo assim antes.
Durante a viagem eu e ela nos aproximamos, trocamos números de telefone e
continuamos conversando por meses antes de nos vermos outra vez.
Na segunda vez que nos vimos eu continuava tensa, mas já me sentia mais
confortável ao lado dela. E ela era perfeitamente compreensível, pois, entendia
que eu tinha problemas com contato humano, que fazia terapia, por isso, não
tocava em mim, mesmo no momento em que nos encontrávamos ou despedíamos.
A cada dia que passava, eu sentia mais necessidade de falar e estar com
Bárbara, e eu não compreendia os meus sentimentos. Não sabia que era possível
sentir algo assim por uma pessoa. Raramente consigo construir laços afetivos
com pessoas, por isso fiquei surpresa quando percebi que eu sentia algo que os
seres humanos entendem como paixão ou amor.
E meus sentimentos por ela só cresciam e incrivelmente, Bárbara também sentia o
mesmo por mim. Ela me confessou na vigésima vez que nos encontramos. Foi um
momento inesquecível. Estará marcado em minha mente até meu último suspiro.
Nesse mesmo dia, Bárbara com certa hesitação, perguntou:
- Eu... Eu posso segurar a sua mão?
Fiquei em silêncio, fechei os olhos e quase sussurrando, respondi que: sim...
Então ela tocou meus dedos com os dela suavemente, depois lentamente envolveu
minha mão nas dela. Meu coração batia de maneira descontrolada e meu peito
doia, estava sufocando, mas eu não a afastei e ela acariciou minha mão, comecei
a sentir o seu calor, abri os olhos e senti o mundo parar mais uma vez. Em um
primeiro momento fiquei um pouco tonta, mas com o passar dos minutos fui me
acalmando e pela primeira vez consegui gostar de um toque humano.
Ela perguntou se eu estava bem, respondi afirmativamente e então Bárbara
suavemente, com cuidado, como se eu fosse feita de um material extremamente
frágil, aproximou-se de mim e tocou os meus lábios com os dela. Eu não me movi,
apenas fiquei ali, sentindo a pressão e o calor dos lábios dela contra os meus.
Não sei quanto tempo ficamos assim, até ela começar a me beijar e
automaticamente, correspondi, estranhamente sem pensar antes ou entrar em
pânico.
Depois daquele dia, houve vários outros encontros e então namoramos. Oito anos
depois nos casamos e vivemos juntas até o dia em que ela morreu. A idade pesou
para ela antes de que em mim. Seu coração lutava muito para continuar batendo e
entendo que todos algum dia chegamos ao fim da viagem da vida, porém essa
constatação não faz a partida dela menos dolorosa.
Bárbara foi a única pessoa que amei de maneira tão intensa e que conseguia
tocar em mim, sem que eu sentisse agonia. Ela é especial, perfeita de uma
maneira indescritível.
Aqueles olhos castanhos claros, profundos e sábios, que combinava perfeitamente com o cabelo de mesma cor, caído sobre os ombros, a sua voz doce, o sorriso encantador, a sua inteligência arrasadora. Enfim, tudo nela me faz falta. Ainda durmo abraçada com o vestido favorito de minha amada, porque assim, sinto um pouco de conforto e segurança, alivia a dor do meu coração cansado.
- Sheila Tinfel
27/12/2021